O "Fórum das Regiões", defende uma Região Norte coincidente com a actual região-plano (CCDR-N) e um modelo de regionalização administrativa, tal como o consagrado na Constituição da República Portuguesa.

O "Fórum das Regiões", considera a Regionalização o melhor modelo para o desenvolvimento de Portugal e para ultrapassar o crescente empobrecimento com que a Região Norte se depara.


segunda-feira, 22 de julho de 2013

Governo fora de prazo

Se o Governo fosse um produto transacionável, a ASAE já o teria removido das prateleiras da democracia e responsabilizado os partidos da maioria parlamentar que o suportam. Apesar de um prazo de validade nominal de quatro anos, este "produto" começou a dar sinais de degradação ao fim de apenas um ano, acabando por apodrecer ao fim de dois, isto é, apenas a meio do prazo.

Olhemos para o Governo da República a partir de três dimensões que caracterizam um produto organizacional: orgânica, missão e liderança.

Na linha da deriva populista e irrefletida que norteou o período pós-eleitoral de 2011, o primeiro-ministro desenhou um Governo de orgânica minimalista, com apenas 11 ministros. A gestão de um país num mundo moderno, onde os tempos são difíceis e os problemas complexos, exige equipas de dimensão adequada. Por exemplo, o Governo finlandês, que tomou posse também em 2011, tinha 19 ministros. Como seria de esperar, o Governo tornou-se numa máquina enferrujada, quase paralisada. Qualquer principiante teria percebido que não se faz um Governo com menos de 15 ministros.

A missão - governar - inscreve-se sempre no quadro de uma visão e de uma orientação ideológica. Sabia-se da predileção de Passos Coelho pela linha mais liberal do tipo "quanto menos Estado, melhor". A este pressuposto acresceu uma crença inamovível nos méritos da austeridade extrema, uma espécie de trilho perfeito ao longo do qual a economia afundaria por um tempo curto, tudo o que era ativo tóxico (empresas, instituições, pessoas) desapareceria e, na sequência, uma esplendorosa primavera, aí pela metade do mandato, daria vida a uma robusta recuperação, com os mercados e a Europa ajoelhados ao milagre português.

Assim não foi, como qualquer economista médio anteciparia, porque não há crescimento sem investimento. O primado das finanças sobre a economia imposto pela dupla Gaspar-Coelho resultou no decréscimo do PIB, no aumento dos impostos, do desemprego e da dívida, no descontrolo do défice e, por fim, na constatação de que as yields não desceram após todo este esforço. O Governo falhou na missão.

A liderança, corporizada pelo primeiro e pelos restantes ministros, deixou dúvidas desde o primeiro dia. Entregar megaministérios a governantes inexperientes, sem peso político para se imporem perante os pares e sem o conhecimento necessário para trabalharem com os atores da sociedade e da economia é, naturalmente, erro de principiante. Mas o melhor diagnóstico deste elenco ministerial foi a imagem derrotada e acabrunhada da bancada do Governo no debate do estado da Nação de sexta-feira. Ministros que não se olhavam, um ministro demissionário que ao que parece tinha já arrumado o gabinete, outro que tem guia de marcha para ser substituído, outra que poderá ver o seu Ministério partido a meio, enfim, uma vergonha para a nossa democracia.

A ASAE é, neste caso, o presidente da República. E, ao contrário da atenta e diligente ASAE da vida real, Cavaco Silva foi dando espaço a um produto em decadência, ao ponto de, quando finalmente a podridão se manifestou de dentro para fora, ver o seu espaço de manobra muito limitado. O caminho, por muito que custe ao presidente, será fatalmente uma eleição antecipada, quanto antes, melhor. Porque em democracia não há artifício político que contorne o sufrágio. Tem consequências na execução do plano de assistência? Certamente que sim. Mas se há dois anos foi possível juntar as três principais forças políticas e negociar um memorando com a troika num quadro de eleições antecipadas, não vejo por que razão não se pode agora renegociar o programa de ajuda, envolvendo as mesmas forças, partindo para um ato eleitoral que nos traga um Governo mais capaz.

Vale aqui recordar o famoso artigo de Cavaco escrito em 2004, no qual recuperou a lei de Gresham para estabelecer o paralelo entre a má moeda que expulsa a boa moeda e os políticos incompetentes que expulsam os políticos competentes. O professor alertava à data para a necessidade de inverter este efeito. Pois bem, esta é a hora de, na primeira pessoa, o agora presidente protagonizar aquilo que no passado defendeu: substituir o mau produto, fora de prazo, por um outro com validade.



José Mendes,  no JN

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