Sinto estar à
beira de uma mudança histórica na minha vida. Até agora tenho sido um acumulador
de todo o tipo de tralha, de livros a discos, passando por artesanato (a última
aquisição foi um enorme cabeçudo, comprado em Viana), revistas ou recordações
de viagens tão diversas e inúteis como passes de transportes públicos, cinzeiros
(não fumo) ou menus de restaurantes.
Também tenho o armário da roupa a abarrotar,
ao ponto de estar convencido de que até morrer não preciso de comprar mais
vestuário. Mas, por favor, não fiquem a pensar que esta abundância excessiva
foi atingida pela via aquisitiva. Não, ela deve-se exclusivamente ao facto de
estar sempre a herdar de dois bons amigos, que se mantêm acima de mim no
processo da engorda, casacos, camisolas e calças em excelente estado e de
marcas reputadas.
Mas sinto que estou num momento de viragem,
prestes a tornar--me num militante do minimalismo, uma nova tendência baseada
no destralhar, ou seja, em vermo--nos livres - dando, emprestando ou vendendo -
de todas as coisas que temos em casa e só servem para nos arreliar, ocupam
espaço, consomem tempo e dinheiro.
Como acho que o que é bom para mim também é
bom para a comunidade, entendi por bem abusar deste cantinho que o nosso JN
generosamente me proporciona para sugerir a Passos Coelho que aproveite esta
crise aberta pelo Tribunal Constitucional para aderir ao minimalismo e começar
pela Caixa Geral de Depósitos um processo profundo e irreversível de destralhar
o Estado português.
Se pensarmos bem, a Caixa só nos dá chatices e
é um péssimo negócio mantê-la. Não dá dividendos e os prejuízos recorde (na
ordem dos 400 milhões/ano) que acumula obrigam-nos a estar sempre a meter lá
dinheiro, em sucessivos aumentos de capital - o último foi de 750 milhões de
euros e piorou as contas do défice.
Além de perder dinheiro, a Caixa é
desobediente e malcomportada. Este janeiro, repetiu a gracinha de 2012,
recusando-se a aplicar os cortes nos salários dos trabalhadores das empresas públicas
previstos no Orçamento. E desafiou o Banco de Portugal ao teimar em manter as
comissões indevidas nos cartões de débito, mesmo depois de todos os bancos
privados terem acatado a sua proibição.
Com 1,2 mil milhões de euros de imparidades
apuradas, a Caixa é líder no campeonato deste elegante sinónimo financeiro para
buracos, devido à atividade de financiadora de capitalistas sem capital
derivada da sua função de braço armado da fação política no Poder.
Apesar de ter uma equipa de 11 gestores, em
que cada um ganha em média mais de um milhão de euros/ano, a Caixa ainda não
conseguiu cumprir a recomendação da troika de despachar a sua posição
maioritária no mercado de seguros. Ou seja, não dão uma para a caixa.
A melhor prova de que a Caixa não serve para
nada é o facto de toda a gente falar na necessidade de um Banco de Fomento para
fazer chegar crédito à economia real - ou seja, para desempenhar a função que o
banco público devia cumprir - e não cumpre. Por isso, o melhor que há a fazer é
destralhar, vendendo a Caixa e aproveitando o encaixe para reduzir a dívida
pública.
Jorge Fiel, no JN