O "Fórum das Regiões", defende uma Região Norte coincidente com a actual região-plano (CCDR-N) e um modelo de regionalização administrativa, tal como o consagrado na Constituição da República Portuguesa.

O "Fórum das Regiões", considera a Regionalização o melhor modelo para o desenvolvimento de Portugal e para ultrapassar o crescente empobrecimento com que a Região Norte se depara.


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Com um O de otário na testa

A prova dos nove tirei-a em Maputo, algures em 1991, após ter jantado comida chinesa com o Jorge Armindo e o Vaz Branco (que à época trabalhavam no grupo Amorim), no Sheik, um restaurante perto do Polana, na esquina entre as avenidas Julius Nyerere e Mao Tsé-Tung.

A seguir ao jantar, descemos para a discoteca, a que se acede por uma porta à direita, após atravessar um corredor, razoavelmente longo e estreito. A porta estava guardada por um porteiro que depois de se afastar para deixar entrar o Jorge e o Vaz Branco me interpelou dizendo: "São cinco mil meticais!"

Rapidamente fiz contas de cabeça e procedi a uma análise comparada da minha fachada com a dos meus amigos. As conclusões deste exercício foram esmagadoras:

1. Não há maneira de a divisão de 5000 por três dar conta certa;

2. Mesmo admitindo que o fato azul do Jorge e o fato cinzento do Vaz Branco fossem de melhor corte que o meu Alto (o topo de gama da Maconde) não me parecia provável que o porteiro pudesse ter detetado isso em tão pouco tempo e num ambiente tão deficientemente iluminado.

Para que não ficassem dúvidas, interroguei o camarada porteiro: "Os cinco mil meticais referem-se à entrada de nós os três ou só à minha?". Foi nesse momento que obtive a confirmação, a prova dos nove, do que já desconfiava há algum tempo. Era só à minha!

Dito por outras palavras, tenho gravado na testa um O, de otário, invisível aos olhos de muita gente (não é, por exemplo, visível nas fotografias ou quando me olho ao espelho para fazer a barba), mas que lamentavelmente é visto por algumas pessoas, por norma gente abusadora e de fraca índole.

Esclareço desde já que não estavam em causa os 5000 meticais. Eu tinha no bolso das calças um rolo de notas de metical, que não consegui gastar e há coisa de dois anos, antes de mudar de casa, ainda estavam arrumadas na gaveta das meias, presas por um elástico, e eram usadas para fazerem as vezes de dinheiro de Monopólio quando jogava poker com os meus filhos. Se o porteiro me tivesse pedido nove mil meticais, eu prontamente lhos teria dado e provavelmente ainda estaria na doce ignorância sobre a capacidade de alguns trafulhas verem um O na minha testa.

Veio-me este episódio à lembrança ao rever indicadores económicos que me levam a desconfiar que os sucessivos governantes instalados em Lisboa têm a capacidade do porteiro do Sheik e veem O, de otários, gravados na testa dos 3,7 milhões de nortenhos.

Apesar de habitarmos em apenas 23% do território e sermos 35% da população, produzimos 40% do VAB, temos uma balança comercial excedentária (a taxa nortenha de cobertura de importações pelas exportações é de 129%, contra uma média nacional de 74%), representamos 50% do emprego industrial - e somos, desde 99, a região mais pobre do país, com um rendimento per capita de 80% da média nacional e 65% da comunitária. Já é tempo de pôr um ponto final a este abuso.

Jorge Fiel, no JN

Barbeiro e sol aos quadradinhos

Entendamo-nos: só por falácia é possível exigir a algumas áreas do Estado a apresentação de contas positivas. Os (muitos) impostos pagos pelos cidadãos visam dar cobertura a uma parte dos custos de exploração de serviços de eminente cariz social. Faz, pois, todo o sentido, por exemplo, a canalização de meios financeiros para a cobertura do défice do Serviço Nacional de Saúde ou dos transportes públicos.

Conversados sobre o princípio geral, sobram métodos de gestão anacrónicos a justificar deslizes gigantescos nas contas.

O caso do setor dos transportes é paradigmático. Superior a 20 mil milhões de euros, o passivo acumulado pela CP, Carris, Metro de Lisboa, Metro do Porto, STCP, TAP, Transtejo e Soflusa é de todo incomportável. Numa parte tem origem, como é óbvio, num incontornável défice gerado pelo pesado investimento em infraestruturas e bilhética abaixo do custo; noutra, no entanto, é fruto de ruinosas decisões administrativas.

Enquanto nos gabinetes governamentais se congemina a reestruturação das empresas públicas de transportes, por estes dias está na moda denunciar as mordomias dos trabalhadores. E é fácil, mas demagógico, crucificá-los.

O país fica naturalmente chocado ao saber da existência de um prémio de assiduidade ou de um subsídio de quilometragem atribuídos aos maquinistas do Metro de Lisboa; é difícil não classificar de intolerável o facto de os trabalhadores da CP usufruírem de viagens gratuitas, extensíveis aos cônjuges, pais, filhos, enteados e... irmãos solteiros! Fica-se aparvalhado ao conhecer-se um prémio de assiduidade por cada mês de trabalho completo na Transtejo; e, espanto dos espantos, que dizer da existência de barbearias nas estações da Carris, apetrechadas para uso privativo de todo o seu pessoal, incluindo reformados?

A indignação geral de um povo causticado pelos sacrifícios é legítima e manda o bom senso reverterem-se situações de privilégio - embora possam contribuir em escala reduzida para baixar défices de exploração injustificados. É, no entanto, enviesada a ideia de atribuir aos trabalhadores das empresas públicas de transportes a responsabilidade por tamanhos despautérios. Muitas das situações de privilégio resultam de reivindicações levadas à mesa das negociações pelas comissões de trabalhadores e sindicatos, e perante as quais sucessivos conselhos de administração se acobardaram, vergando--se e dando assentimento à integração na contratação coletiva ou em acordos de empresa!

Haja, pois, algum decoro e a limitação da intoxicação pública.

Parte substantiva da acumulação de défice público do país é consequência de péssimos atos de gestão - as PPP são o mais fresco e desastrado exemplo!. Muitos políticos e gestores têm passado incólumes a erros grosseiros, nalguns casos acabando por saltitar de poder em poder, de administração em administração, entre estatuto social, ordenados chorudos e prémios principescos. Ora, tais percursos têm sido errados; alguns deveriam já estar a ver o sol nascer aos quadradinhos

Jornal de Noticias

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

As desvirtudes do gigantismo

A brutalidade da dívida das autarquias tem duas consequências muitos práticas - a queda de qualidade dos serviços que prestam às populações com cujos impostos se sustentam, por um lado, e, por outro, a asfixia das frágeis economias locais, dado os atrasos nos pagamentos de curto prazo a pequenos fornecedores (são cerca de 1500 milhões de euros, 1% do PIB).

No fundo e preservadas as distâncias, estamos a falar de pequenas "Madeiras" espalhadas por todo o país. Lisboa é, por exemplo, uma pequena Madeira, no que ao endividamento diz respeito. Mostram as contas feitas pelo JN (ver página 2 desta renovada edição) que a capital tem uma dívida superior a mil milhões de euros. Colossal, no dicionário de Passos Coelho. Porquê? Porque é a maior cidade portuguesa? Sim, mas não só.

Os números mostram uma curiosa e emblemática realidade. Se o critério for o do número de habitantes, então a dívida de Lisboa, cujo concelho tem 545 mil habitantes, devia rondar os 400 milhões de euros (menos de metade do valor real). É essa a soma das dívidas de Porto e Gaia, que têm, por junto, sensivelmente o mesmo número de habitantes que a capital do país.

Donde, há que acrescentar algo mais à análise para justificar a discrepância.

Dados objetivos: as despesas com pessoal são, em Gaia e no Porto, cerca de metade da receita fiscal (o que já não é pouco). Em Lisboa, as despesas com pessoas são 75% das receitas (o que é brutal). Não há nenhuma empresa que consiga sobreviver com estes magníficos rácios. Vale o mesmo dizer que vivemos num país falido com uma capital a agonizar. Não é um retrato bonito...

A culpa é dos sucessivos presidentes de Câmara que deixaram os números chegar a este desaconselhável estado? Alguma será - e haverá, com toda a certeza, uns mais culpados do que outros. Mas o verdadeiro problema está a montante da atuação dos autarcas - e é um problema político chamado gigantismo, ou elefantíase municipal.

Está bom de ver que Lisboa cresceu para lá dos limites que a racionalidade territorial recomenda. Está bom de ver que, a partir de um qualquer momento, os criadores perderam o controlo da criatura, ao ponto de a criatura ameaçar o criador. Problema: para sustentar a criatura (isto é: para alimentar os servidores da criatura), são necessários mais e mais milhões de euros, numa insaciável espiral que suga recursos financeiros atrás de recursos financeiros.

A reforma autárquica amenizará o problema, mas não o resolverá. Desde logo porque a elefantíase municipal lisboeta não é um fenómeno conjuntural - é, sim, uma opção estrutural, resultado das políticas que têm empurrado para a capital os "emigrantes" do resto do país. A fatura paga-se, a doer, mais cedo ou mais tarde...

Paulo Ferreira no JN

Mal maior

A depressão e o medo apoderaram-se dos portugueses. A causa próxima do desalento generalizado é o crónico agravamento de impostos, a par da redução do valor das reformas e dos salários na função pública.
Os sucessivos aumentos da carga fiscal, ao arrepio de todas as promessas em sentido contrário, vieram desacreditando progressivamente a vida política. Os cidadãos, fartos de promessas eleitorais não cumpridas, estão hoje mais vulneráveis a propostas totalitárias de consequências imprevisíveis para o regime democrático.

A nível da actividade económica, os efeitos são também muito negativos. Receosos, os consumidores retraem-se, o comércio e os serviços experimentam uma crise de que não há memória.

Esta diminuição do consumo provoca o efeito contrário ao que o estado pretenderia, perspectivando-se até a redução da colecta de IVA.

Por outro lado, o agravamento dos custos de contexto para a actividade empresarial tem levado muitos negócios à falência.

Com o encerramento de empresas, aumentam as despesas do estado com contribuições sociais.

Acresce que níveis de imposto elevados levam sempre ao crescimento generalizado da fuga ao fisco e à diminuição da receita fiscal.

O aumento de impostos, a partir de um determinado nível, é assim uma medida contraproducente.

Mas os piores efeitos do agravamento fiscal, conjugado com a diminuição dos salários e das pensões, sentem--se em termos sociais e psicológicos.

Estas medidas permitem a propagação da ideia de que se pode esperar do estado português tudo o que é negativo.

Doravante, os cidadãos e as empresas sabem que se movem num quadro fiscal que pode mudar a qualquer momento.

Não há planeamento que resista. A imprevisibilidade assusta e gera desconfiança.

Deste modo, as medidas que vão retirando direitos aos cidadãos, a pretexto de que constituem um mal menor, são afinal a causa de um mal bem maior.

Provocam este ambiente de medo e estagnação, que paralisa as empresas e angustia todo um povo.


Por:Paulo Morais, Professor Universitário