O "Fórum das Regiões", defende uma Região Norte coincidente com a actual região-plano (CCDR-N) e um modelo de regionalização administrativa, tal como o consagrado na Constituição da República Portuguesa.

O "Fórum das Regiões", considera a Regionalização o melhor modelo para o desenvolvimento de Portugal e para ultrapassar o crescente empobrecimento com que a Região Norte se depara.


terça-feira, 2 de abril de 2013

Seja bem-vindo o gás de Sócrates


Fórum das Regiões: Não se percebe a motivação da petição pública que andou pelas redes sociais, visando impedir o aparecimento de Sócrates na RTP. Teria todo o sentido, se esta se reportasse a todos os governantes que por aí dão lições. Veremos se um dia destes o ex. primeiro ministro Passos Coelho, ou o ex. ministro Gaspar, etc, não virão ao canal público fazer o mesmo papel.


O povo português dispõe de uma característica única: governantes e governados adoram o entretenimento recíproco. Há problemas? Basta um prato de lentilhas e os acordes de uma canção do bandido, em voz professoral desmemoriada, para trocar o essencial pelo acessório, esvaziar angústias e alijar responsabilidades.
Uns atrás dos outros, somam-se os casos da superficialidade e da retórica fácil. Adorável.
O carrossel mediático dos profissionais da política e da economia é tipificador. Não há santo dia sem homilias "catedráticas" sobre o estado do país protagonizadas por quem foi incapaz de inverter o curso errático de Portugal nas últimas décadas. São às catadupas os pavões sábios do entretenimento.
Descanse o leitor, a ordem é arbitrária. Mas de Mário Soares a Jorge Sampaio, de Eduardo Catroga a Bagão Félix, de António Vitorino a Carlos Carvalhas, de Marcelo Rebelo de Sousa a Silva Lopes, de Marques Mendes a Francisco Louçã, de Augusto Santos Silva a Manuela Ferreira Leite, de Pedro Santana Lopes a Medeiros Ferreira, de, de, a... não faltam os retratistas-projetistas do que é o país e do que deveria ser. E a estes muitos outros se seguirão. É garantido.
Um dia chegará a vez de Passos Coelho, Vítor Gaspar ou Paulo Portas disporem de um tempo de antena para dar lições de governança.
Para já, nas últimas horas, ficou a saber-se de um novo dissertador para os serões dos portugueses: José Sócrates fará opinião através da RTP - afinal, o canal que todos pagamos em impostos e na taxação pela fatura da eletricidade! Eis um golpe de asa banal dos programadores: permitir ao ex-primeiro-ministro que nos dê lições, no habitual jogo politiqueiro nacional de passa-culpas, de como deve o país safar-se dos credores e entrar na via do desenvolvimento. Sócrates será apenas o mais recente cérebro nacional a explicar como somos vítimas de uma cabala montada não agora, não há dez ou vinte anos, não por Marcelo Caetano ou Salazar, mas sim por D. Afonso Henriques. Iluminar-se-á em cada um de nós a pachorra bastante para debater à mesa do café a incompetência daqueles que ensaiaram cânticos de sereia e acabaram legitimados pelo voto. E nem que seja por essa vantagem, a de nos entretermos com novo figurante, pois que Sócrates seja bem-vindo!
Assim como assim, para que deve o país abrir espaço à discussão sobre o modo teso como os deputados do Chipre não foram capachos e mandaram dar uma volta os eurocratas que lhe queriam impor o confisco em nome de um alegado resgate? Para quê analisar a postura do chefe da Igreja Ortodoxa no Chipre, ao disponibilizar, inclusive, as terras de que é proprietária para evitar a falência do país e manter a dignidade de um povo responsável por 0,2% do PIB da Zona Euro?
O Chipre e a crise europeia não interessam nada. Mesmo a minudência geoestratégica da Rússia poder ficar dona e senhora de novas jazidas de gás e um destes dias fechar a torneira energética a quem na Europa por si não alinhe.
Bem vistas as coisas, é mais excitante o entretenimento em torno de Sócrates e outros figurantes do mesmo jaez.
O garrote da dívida ficará para outros pagarem. De outras gerações.

Fonte: Jornal I

O regresso de Sócrates, o lobo mau


Afinal, quem tem medo do lobo mau? Vamos esquecer o Capuchinho Vermelho ou os Três Porquinhos porque esta não é uma história para crianças. É a história de um país bacoco que lida mal com o carisma alheio, procurando justificar o desmoronamento político que se avizinha com um passado já devidamente escrutinado. É, também, a história de um país que, à falta de outros argumentos e entretenimento, avança com patéticas petições públicas por tudo e por nada. A mais mediatizada dos últimos tempos é, pasme-se, para impedir que um ex-primeiro-ministro seja contratado (e, ainda por cima, probono) por uma televisão para um novo espaço de comentário político. A aparição de José Sócrates deverá ser analisada a dois níveis distintos, ainda que estas coisas estejam todas ligadas.
O primeiro é político. O insuspeito social-democrata e, por sinal, comentador Marques Mendes acha que o regresso de Sócrates pode ser "mortífero" para o Governo. É certo que o peso do antigo primeiro-ministro vai transformar, ainda mais, a oposição de Seguro numa brincadeira de meninos, mas Mendes tem razão quando afirma que será Passos o verdadeiro alvo de Sócrates. O ex-líder socialista ferve em pouca água vezes de mais para evitar ajustar contas de tudo o que dele foi dito pelos membros do atual Governo. Nesta revisão do passado recente, Sócrates não deverá igualmente deixar Cavaco Silva em sossego.
O segundo nível do regresso de José Sócrates é jornalístico. Ao ir buscar para o ecrã o mais odiado - mas também amado - dos ex-primeiros-ministros, a RTP protagonizou uma contratação surpreendente. E, de uma só vez, atirou para segundo plano os políticos comentadores da concorrência: Marcelo Rebelo de Sousa na TVI (e as suas mais do que previsíveis análises com direito a réplicas na generalidade da imprensa); e Marques Mendes, recentemente seduzido pelos encantos da SIC e que aos espectadores se apresenta muito mais como a correia de transmissão de um qualquer 'garganta funda' da esfera governativa do que como o comentador que quer ser.
Sócrates no ecrã vai eclipsar os seus pares e garantir, sem grandes margens de erro, audiências à RTP.
Eram, portanto, previsíveis as reações à ousadia da televisão pública. José Sócrates foi, para o bem e para o mal, o mais carismático dos líderes portugueses dos últimos anos e esse é um património que uma (breve) ida para Paris não apaga. O que não se esperaria é que o seu eco transbordasse as fronteiras nacionais.
A sua contratação televisiva mereceu ontem generosas referências na imprensa de Direita no país vizinho. O "La Vanguardia", de Barcelona, escreveu que "em Espanha ninguém poderia imaginar que no canal 1 da TVE, logo após o Telejornal, aparecesse José Luis Zapatero [ex-chefe do Governo socialista] para comentar a atualidade política semanal". O "El Mundo", de Madrid, refere a multiplicação de petições online contra e a favor da passagem de Sócrates "de primeiro-ministro a tertuliano" televisivo, referindo ainda as suas responsabilidades na crise iniciada em 2008, mas sem admitir que, se Sócrates cá tivesse continuado, haveria sempre a hipótese de, tal como em Espanha, estarmos sem resgate e hipotecados à troika.
Por tudo isto, a diabolização do regresso de Sócrates era inevitável. Essa fatalidade não pode é servir para atirar alguém para uma lista negra onde aos proscritos está vedado o regresso à vida pública.


Alfredo Leite, no JN

Rui Moreira e o fim do rodízio


A recomposição do sistema político português segue em passo acelerado. É há muito evidente o divórcio entre eleitos e eleitores, como é há muito evidente que está esgotado o modelo assente em partidos tradicionais com crescente tendência para se fecharem sobre si mesmos, modo de segurar (e assegurar) a distribuição de uma camada de poder cada vez mais fina.
Creio que as gravíssimas consequências sociais e económicas resultantes deste tempo de agonia em que vivemos tenderão a pôr ainda mais depressa em xeque o atual modelo. A participação e a representação democráticas não serão mais tributárias desta espécie de rodízio parlamentar que nos é oferecido: mudam as caras, mas, para problemas imensamente diferentes e mais complicados do que aqueles que se nos colocavam há meia dúzia de anos, as respostas continuam as mesmas.
Este caldo é perigoso e estimulante. Perigoso, porque pode gerar populismos da pior espécie, protagonizados por gente de verve dura e cabeça mole. Estimulante, porque nos obriga a olhar com redobrado cuidado para o que está e a pensar com triplicado cuidado no que queremos que venha a estar.
Serão as eleições autárquicas, pelo contexto muito específico em que se realizam, uma espécie de primeira amostra deste movimento?
Tomemos o exemplo do Porto.
Rui Moreira apresentou ontem a sua candidatura à Câmara. É um desejo de longa data só agora concretizado. E porquê só agora?
Resposta (demasiado) fácil: porque o presidente da Associação Comercial do Porto (ACP) detesta Luís Filipe Menezes e fará tudo, mancomunado com Rui Rio, para estragar a festa do ex-líder do PSD. Fraco argumento. Por que razão sairia Moreira da sua zona de conforto para se dedicar a esta esgrima, sabendo que pode ser ferido de morte, caso perca por muitos?
Resposta (julgo) mais adequada: porque o presidente da ACP percebeu, justamente, que a mudança em curso lhe facilita o objetivo. O voto de protesto contra o Governo que, sobretudo nas zonas mais urbanas da cidade, afetará Menezes pode cair para o seu lado, mais do que para o lado de Manuel Pizarro, candidato do PS. O voto dos que elegeram Rio contra Fernando Gomes pode cair para o seu lado, na medida em que, em certo sentido, Rui Moreira aparece como o homem que não pertence ao "sistema" (tal como Rio há 12 anos), coisa que não acontece com Pizarro. O voto dos que procuram novos protagonistas para novos problemas pode cair para o seu lado, uma vez que Menezes e Pizarro são candidatos com a carga política e ideológica que está, todos os dias, a ser questionada.
Sim: a fulanização é decisiva nestes atos eleitorais. Sim: Menezes é um temível "chalenger". Sim: convém não esquecer a determinação de Pizarro. Mas também convém não esquecer que, mais cedo do que tarde, a recomposição em curso do sistema partidário começará a ver--se, com flagrante nitidez, nas urnas.

Paulo Ferreira, no JN

O meu smoking e as portagens na A28


Tenho um smoking que comprei para ir à festa do 25.o aniversário do casamento de Fernanda e Américo Amorim. Usei-o apenas mais uma vez na cerimónia final das comemorações dos 25 anos do "Expresso". E não vejo jeitos dele voltar a ter serventia, apesar do nosso JN estar prestes a fazer 125 anos. Como o dress code afrouxou, suspeito de que o smoking não voltará a sair do armário.
Foi mau negócio comprar um smoking para o usar só duas vezes. A atenuante é que os tempos eram outros, valorizava-se mais o possuir do que o usufruir. O tempo nunca mais voltará para trás, para esses dias em que quase todos éramos consumidores bulímicos.
Neste novo normal a que nos estamos a ajustar, o desperdício é o inimigo número 1 e a prioridade tem de ser aproveitar ao máximo os bens e equipamentos que adquirimos quando o dinheiro abundava.
Um dos efeitos secundários positivos da questionável aposta no betão foi o Alto Minho ficar equipado com uma boa rede de autoestradas, que serviu de base a uma estratégia de desenvolvimento desenhada a partir da sua localização a uma hora de distância das áreas metropolitanas de Porto, Vigo e Braga.
Com duas autoestradas verticais (A28 pelo litoral e A3 pelo interior) e uma horizontal (a A27), o Alto Minho duplicou as exportações e atraiu investimento estrangeiro, designadamente na energia eólica e na metalurgia e metalomecânica, onde acolheu um invejável naipe de empresas fornecedoras de componentes para a indústria automóvel (Citroën de Vigo e Autoeuropa, mas não só), naval e aeronáutica.
Este esforço tem sido torpeado pelo Governo de Lisboa que, não satisfeito em ter deixado cair a aposta estratégica de Sócrates nas energias renováveis (que justificou o mega-investimento dos alemães da Enercon, o coração do cluster eólico), está a erguer um nova fronteira que separa o Norte da Galiza, através da introdução de portagens numa A28 primitivamente apresentada aos habitantes e investidores como scut e ferramenta para o desenvolvimento regional.
Se fosse um país, a Galiza seria o 6.o mais importante destino das nossas exportações, imediatamente a seguir ao Reino Unido e à frente de Itália, Bélgica e Brasil - que apenas nos compra 1/3 dos galegos.
Introduzir à má fila, e com um sistema de cobranças absurdo, portagens nas A28 e A27 é espetar uma faca nas costas do desenvolvimento de uma região com uma riqueza de 62% da média comunitária (do outro lado do rio Minho, a percentagem sobe para 93%).
E não me venham com a treta do princípio do utilizador pagador porque os impostos de courenses e caminhenses também vão parar às empresas públicas de transportes, apesar deles não usarem o metro de Lisboa e a linha de Cascais.
Portajadas, a A28 e a A27 são quase tão úteis como o meu smoking. Custaram um balúrdio e estão às moscas, por causa das portagens, com o cortejo de efeitos secundários negativos que elas acarretam: aumento da sinistralidade rodoviária, tempo perdido e desgaste nas EN. É preciso ser muito míope para não ver isto.

Jorge Fiel, no JN