Tenho um smoking que comprei para ir à festa do 25.o aniversário
do casamento de Fernanda e Américo Amorim. Usei-o apenas mais uma vez na
cerimónia final das comemorações dos 25 anos do "Expresso". E não
vejo jeitos dele voltar a ter serventia, apesar do nosso JN estar prestes a
fazer 125 anos. Como o dress code afrouxou, suspeito de que o smoking não
voltará a sair do armário.
Foi mau negócio comprar um smoking para o usar só duas vezes. A
atenuante é que os tempos eram outros, valorizava-se mais o possuir do que o
usufruir. O tempo nunca mais voltará para trás, para esses dias em que quase
todos éramos consumidores bulímicos.
Neste novo normal a que nos estamos a ajustar, o desperdício é o
inimigo número 1 e a prioridade tem de ser aproveitar ao máximo os bens e
equipamentos que adquirimos quando o dinheiro abundava.
Um dos efeitos secundários positivos da questionável aposta no
betão foi o Alto Minho ficar equipado com uma boa rede de autoestradas, que
serviu de base a uma estratégia de desenvolvimento desenhada a partir da sua
localização a uma hora de distância das áreas metropolitanas de Porto, Vigo e
Braga.
Com duas autoestradas verticais (A28 pelo litoral e A3 pelo
interior) e uma horizontal (a A27), o Alto Minho duplicou as exportações e
atraiu investimento estrangeiro, designadamente na energia eólica e na
metalurgia e metalomecânica, onde acolheu um invejável naipe de empresas
fornecedoras de componentes para a indústria automóvel (Citroën de Vigo e
Autoeuropa, mas não só), naval e aeronáutica.
Este esforço tem sido torpeado pelo Governo de Lisboa que, não
satisfeito em ter deixado cair a aposta estratégica de Sócrates nas energias
renováveis (que justificou o mega-investimento dos alemães da Enercon, o
coração do cluster eólico), está a erguer um nova fronteira que separa o Norte
da Galiza, através da introdução de portagens numa A28 primitivamente
apresentada aos habitantes e investidores como scut e ferramenta para o
desenvolvimento regional.
Se fosse um país, a Galiza seria o 6.o mais importante destino das
nossas exportações, imediatamente a seguir ao Reino Unido e à frente de Itália,
Bélgica e Brasil - que apenas nos compra 1/3 dos galegos.
Introduzir à má fila, e com um sistema de cobranças absurdo,
portagens nas A28 e A27 é espetar uma faca nas costas do desenvolvimento de uma
região com uma riqueza de 62% da média comunitária (do outro lado do rio Minho,
a percentagem sobe para 93%).
E não me venham com a treta do princípio do utilizador pagador
porque os impostos de courenses e caminhenses também vão parar às empresas
públicas de transportes, apesar deles não usarem o metro de Lisboa e a linha de
Cascais.
Portajadas, a A28 e a A27 são quase tão úteis como o meu smoking.
Custaram um balúrdio e estão às moscas, por causa das portagens, com o cortejo
de efeitos secundários negativos que elas acarretam: aumento da sinistralidade
rodoviária, tempo perdido e desgaste nas EN. É preciso ser muito míope para não
ver isto.
Jorge Fiel, no JN
Sem comentários:
Enviar um comentário