O "Fórum das Regiões", defende uma Região Norte coincidente com a actual região-plano (CCDR-N) e um modelo de regionalização administrativa, tal como o consagrado na Constituição da República Portuguesa.

O "Fórum das Regiões", considera a Regionalização o melhor modelo para o desenvolvimento de Portugal e para ultrapassar o crescente empobrecimento com que a Região Norte se depara.


segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

O presidente no seu melhor

A mensagem de Ano Novo dita ontem aos portugueses pelo presidente da República é um bocejo. São seis páginas de conversa mole e desinteressante em que Cavaco Silva mostra como politicamente é: um monumento ao taticismo e ao equilibrismo, de modo a não chatear Deus, nem incomodar o diabo.

Ao dar uma no cravo e outra na ferradura, como diz o povo, o chefe de Estado mostra, por outro lado, toda a sua fragilidade enquanto ator político. Num tempo que reclama decisão e ação, o presidente da República escolhe a lassidão (política, claro).

Cavaco Silva está metido na trincheira que o próprio cavou quando, na crise do verão quente de 2013, tentou transformar um triângulo num quadrado, tese em que ontem insistiu, ainda que de maneira mais sibilina. A embrulhada do "compromisso de salvação nacional" foi de tal forma mal gerida e teve um tal resultado que, agora, o chefe de Estado não pode, sob pena de abrir o flanco, tecer um encómio ao Governo ou, ao invés, dirigir-lhe uma crítica mais severa - seria imediatamente acusado de estar a tramar Passos, por quem, como se sabe, não morre de amores.

Piscar o olho a Seguro é, igualmente, possibilidade fora de causa. A inversa também é verdadeira. Um elogio ou um ralhete ao líder do principal partido da Oposição seriam tomados como uma ajuda ao Governo e uma afronta ao PS.

É por estar metido nesta camisa de onze varas que o chefe de Estado nos presenteou com pérolas do seguinte calibre:

- "O desemprego manteve-se em níveis muito elevados". Ai sim?
- "Orgulhamo-nos de viver numa democracia consolidada". Viva!
- "No ano findo, surgiram sinais que nos permitem encarar 2014 com mais esperança". Consta que o comum dos portugueses ainda não avistou tais "sinais", apesar de redobrados esforços para chegar ao final do mês com os bolsos mais compostos.
- "Há que reconhecer o extraordinário esforço feito pelos nossos empresários e trabalhadores". Ai sim?
- "Há razões para crer que Portugal não necessitará de um segundo resgate. Um programa cautelar é uma realidade diferente". A sério?

Há um ano, o presidente da República mandou o Orçamento do Estado para o Tribunal Constitucional, por entender que os gigantes sacrifícios pedidos aos portugueses afetavam "alguns mais do que outros", facto que naturalmente lhe suscitava "fundadas dúvidas".

Este ano, apesar da violência da crise continuar a manifestar-se em todo o seu esplendor, Cavaco não esclareceu sequer se pretende pedir aos juízes do Palácio Ratton ajuda para descortinar eventuais problemas no Orçamento. A razão é simples: o presidente da República odeia, mas odeia mesmo, meter-se em (inevitáveis) problemas antes do tempo.

Paulo Ferreira, no JN

O Mundo está a mexer, e nós a ver

O Mundo está a mexer mas a verdade é que, no meio da nossa crise e angústias, nos fomos talvez desleixando e vendo menos o seu movimento.

Os Estados Unidos, por exemplo (mas também o Brasil), viraram de forma decidida para o continente asiático, de onde percebem sinais importantes de futuro. E o "futuro", esse, mostra tendência curiosa para acelerar, antecipando desenvolvimentos que só esperávamos, de forma algo burguesa, para daqui a algumas décadas.

E nós, por cá?

Nós, por aqui na nossa Europa, deixámo-nos apanhar pela mania de quase só olharmos para o umbigo, seja por efeito da crise que corrói sociedades e valores, seja por efeito da anemia que tomou de assalto a União Europeia e em que não se descobre mezinha que a consiga afastar. Assim, quando um dia arranjarmos tempo para parar e pensar, arriscamo-nos a descobrir que não somos relevantes como futuro, que somos cada menos relevantes como presente. E que, no limite, somos somente passado.

Agora, hoje, e devido a processos de alteração profunda dos poderes internacionais, aquilo que vai ocorrendo no continente asiático tem um impacto muito mais direto, nítido e imediato num plano global do que há uns anos.

A China, segue o seu caminho. Sabe que o tempo corre a seu favor e, muito pragmática, consegue em paralelo harmonizar uma determinada forma (que diz manter, claro) com uma substância cada vez mais diferente. Veja-se como, num espaço de dias, foi capaz de festejar com solenidade o 120º aniversário de Mao Tse Tung como depois, pela mão do legislador, acabar com os campos de reeducação e, no essencial, com a aberrante política do filho único. O líder agora festejado, estou certo, não gostaria nada destas evoluções, e quem lhas tivesse proposto bem faria em só dar tal passo se tivesse as costas muito quentes ou se entendesse já ter vivido o suficiente. Hoje, no entanto, o "velho" Mao continua a ser uma referência unificadora, cada vez mais icónica e menos ideológica, e a sociedade chinesa convive bem com tal circunstância. Mao no mausoléu, a mudança no terreno: pouco a pouco, como convém a um poder que, como acima disse, não tem pressa.

Já mais dificuldades em digerir o passado recente tem o Japão, por muito que diga o contrário. A questão, já se sabe, está relacionada com o papel desempenhado por aquele País logo antes e durante a Segunda Guerra Mundial. A Alemanha, a bem ou a mal, conseguiu muito melhor essa digestão, porventura porque o que fez foi mais visível e "próximo". Mas, sem atingir os patamares de horror dos nazis, as forças japonesas cometeram atrocidades: sem ir mais longe, penso na "violação" de Nanquim e na prática miserável das "mulheres de conforto".

Sobre tudo isto pesa um manto muito ambíguo. Na recente visita feita a um monumento aos mortos japoneses em combate, é claro que o Primeiro-Ministro japonês não podia ignorar que também estava a honrar criminosos de guerra, cujos nomes lá estão gravados. Não podia ignorar, depois, que com tal gesto estava a provocar a China e a Coreia do Sul, cujos povos tanto sofreram às mãos das tropas imperiais japonesas. Junte-se a este gesto a discussão interna sobre a (re)militarização japonesa perante a "ameaça" do poder bélico chinês e teremos uma desagradável sensação de déjà vu. Um mau déjà vu, por sinal.


Azeredo Lopes, no JN

A crise vai entrar em crise

Foi em 1415, o ano da conquista de Ceuta? Ou um pouco mais tarde, em 1453, quando Constantinopla caiu às mãos do Império Otomano? As opiniões dos historiadores dividem-se quanto ao acontecimento que marca o fim da Idade Média. Há até os que preferem situá-lo em 1492, quando Colombo achou a América julgando que estava a chegar à Índia.

Assinalar marcos cronológicos ajuda à compreensão do passado e facilita a exposição de conhecimentos. Mas pode ser prejudicial se a importância das datas-baliza não for contextualizada.

O assassinato em Sarajevo do arquiduque Francisco Fernando deflagrou a I Guerra Mundial porque foi a faísca que fez explodir o barril de pólvora que a Europa era em 1914. E ao contrário da versão simplex de Sócrates, o Mundo não mudou em 15 dias, após a falência da Lehman Brothers, que foi apenas a gota de água que fez transbordar um copo cheio pelas vigarices e malfeitorias cometidas por um bando de financeiros gananciosos deixados à rédea solta pelos governos.

Eu costumo indicar a compra do BPA pelo BCP, finalizada em março de 1995, como o acontecimento que marcou o início do declínio do Norte e, por arrastamento, do resto do país. Mas a transferência para Lisboa de um dos últimos centros de poder que resistiam fora da capital, bem como a sua concentração em mãos aventureiras (a história recente do BCP encarregou-se de dar razão às profecias de João Oliveira), foi apenas o ato final da tragicomédia do processo de privatizações conduzido por Cavaco.

Em vez de favorecer a consolidação dos grupos privados emergentes, que tinham despontado a Norte após o 25 de Abril, Cavaco preferiu entregar bancos, seguros e grandes companhias, nacionalizadas no calor da revolução, a capitalistas jarretas sem capital, que apenas tinham prosperado à sombra dos favores do salazarismo - e/ou encher os bolsos de comissões e mais-valias a uma corte de laranjinhas sequiosos de dinheiro e poder.

Como sou otimista e confiante no futuro, quero acreditar que a constituição do banco de fomento, prevista para o final da primavera e que coincidirá com a partida da troika, será a data que assinalará o fim do período de estagnação e sacrifício em que vivemos.

Em vez de apostar no jackpot do Euromilhões, prefiro depositar todas as fichas da minha esperança no banco que a partir do Porto vai aumentar a liquidez numa economia exangue e assim tentar compensar os efeitos perniciosos do enorme aumento de impostos, da colossal redução da despesa e da brutal crise de crédito que em três anos retirou 14 mil milhões de euros de financiamento às PME.

Para criarem emprego e aumentarem ainda mais as nossas exportações, as empresas precisam do sangue do crédito a preços competitivos e maturidades razoáveis que lhe tem sido negado pela generalidade da Banca. Religiosos ou não, todos rezamos para que o banco de fomento seja o remédio eficaz para a doença do crédito escasso e caro - e a ferramenta que nos ajude a fazer com que esta crise entre em crise e passe à História.


Jorge Fiel, no JN