O "Fórum das Regiões", defende uma Região Norte coincidente com a actual região-plano (CCDR-N) e um modelo de regionalização administrativa, tal como o consagrado na Constituição da República Portuguesa.

O "Fórum das Regiões", considera a Regionalização o melhor modelo para o desenvolvimento de Portugal e para ultrapassar o crescente empobrecimento com que a Região Norte se depara.


terça-feira, 17 de setembro de 2013

Já sei o que é requalificar

O comunicado saído do último Conselho de Ministros (CM) ficará para os anais da História recente da democracia portuguesa. A linguagem utilizada no documento é, porventura, o melhor exemplo de como o Governo (ou, pelo menos, quem, em nome dele, redige as conclusões saídas daqueles encontros) perdeu a capacidade que lhe resta - se é que restava alguma - para tratar os cidadãos como pessoas. Vejamos.

Obrigado pelo Tribunal Constitucional, essa força de bloqueio, a rever "o regime jurídico da requalificação de trabalhadores em funções públicas", o Governo decidiu, passo a citar: "acrescentar um motivo à racionalização de efetivos, identificando-o e caracterizando-o - desequilíbrio económico-financeiro estrutural e permanente do órgão ou serviço - e apresentando critérios para a sua verificação - de que os seus efetivos se encontram desa-justados face às atividades que prossegue e aos recursos financeiros que estruturalmente lhe possam ser afetos".

É provável, caro leitor, que este linguajar lhe seja estranho. Mas, basicamente, o que o Governo pretende é: racionalizar os efetivos requalificando-os. Tradução para português mais ou menos corrente: despedem-se os alegados excedentários ou, em alternativa, colocam-se numa bolsa com salários de miséria. Aos que passarem o crivo do despedimento aplica-se uma dose de requalificação. Com isto, o Governo lava as mãos e acerta as contas no Excel. É bastante provável que, para que as contas batam finalmente certo, seja necessário repetir o exercício de requalificação, novamente racionalizando os efetivos, ou seja, despedindo ainda mais.

Por estes dias tive a sorte de aprender o real significado da palavra requalificar. Na escola do meu filho, são os professores que, à vez, terão de tomar conta dos meninos no recreio. Porquê? Porque faltam auxiliares. Aliás, este processo de contínua indignidade arranca sempre assim: os primeiros a sentir na pele o efeito da racionalização são os elos mais frágeis da cadeia, os que menos ganham, os que mais dificuldades terão para sobreviver. Mais: os professores passam a ter apenas meia hora por semana para atender os encarregados de educação de turmas com 28 e mais alunos. Porquê? Porque estão no limite do horário.

O exemplo pode parecer caricatural. Mas não é. Por esse país fora, repetir-se-ão, com toda a certeza, casos iguais ou bem piores do que este.

Tudo resulta de um equívoco inicial: teria sido melhor o Governo dizer aos portugueses, olhos nos olhos, que isto só lá vai se todos perdermos 20% ou 30% dos nossos rendimentos e regalias. Nada é pior do que arrastar na lama a dignidade das pessoas com conversas como a do comunicado do CM. É isso que está a acontecer.

Paulo Ferreira, no JN

Líder do PS quer que bancos passem a pagar IMI para aliviar famílias

Fórum das Regiões: Parece-nos uma proposta interessante, o problema é implementá-la, quando chegados ao governo!


O secretário-geral do PS, António José Seguro, defendeu, terça-feira, que os bancos e fundos imobiliários devem passar a pagar Imposto Municipal Sobre Imóveis (IMI) das casas que possuem, mas esse encargo deve ser reduzido para as famílias.


As casas, segundo o líder socialista, desvalorizaram nos últimos anos. No entanto, frisou, "as Finanças continuam a aplicar o IMI" como se o imóvel ainda valesse o mesmo, quando "já vale menos".

"Propomos que as Finanças atribuam o valor justo da casa", ou seja, que procedam a uma atualização do valor patrimonial, "de modo a que o imposto incida sobre o valor real da casa", defendeu.

Se isso for feito, "as pessoas vão pagar menos" e "o Estado também recebe menos", mas essa diferença tem que se "ir buscar aos donos dos fundos imobiliários, parte deles" são "propriedade dos bancos".

"Há muitos fundos em Portugal que são donos de casas", mas "pagam zero" de IMI, disse Seguro, sustentando: "É altura de os bancos também pagarem IMI sobre as suas casas, para fazerem justiça e para aliviarem as famílias".

O secretário-geral do PS discursava em Cuba, na terça-feira à noite, durante uma ação de apoio à candidatura de Ana Raquel Soudo, a cabeça-de-lista do PS às autárquicas neste concelho, cuja câmara é gerida pelo autarca socialista Francisco Orelha, que não se recandidata.

Depois de um dia passado em "terras" alentejanas, com visitas a vários concelhos do distrito de Beja, Seguro "fechou" em Cuba esta sua deslocação, lembrando as pessoas que assistiam à intervenção que a crise que o país atravessa começou "há cinco anos", provocada "pelo sistema financeiro, pelos bancos".

"Olhem para o lado. Veem algum banco aflito? Olhem para o lado. Veem pessoas aflitas, pessoas a passarem dificuldades", argumentou, acusando o Governo de, perante esta situação, responder com "mais cortes" nas funções sociais do Estado.

É preciso, de acordo com António José Seguro, "parar com os cortes", porque "cortar não é reformar" e o que é necessário "para equilibrar as contas públicas" nacionais "é pôr um limite na despesa, mas dar prioridade à economia e ao emprego".

Retomando uma proposta em que insistiu nos últimos dias, na segunda-feira no distrito de Évora e na terça¬-feira na região de Beja, Seguro disse que é necessário um "programa de desenvolvimento para o interior" do país, que seja capaz de criar emprego.

"O interior tem um problema de despovoamento", mas "é porque as pessoas não gostem de viver no interior. É porque não há oportunidades de trabalho e as pessoas são obrigadas a emigrar daqui", afirmou, afiançando que o emprego tem que ser "a prioridade", pois, é o que "combate a miséria, a pobreza, a exclusão social".



Fonte: Jornal de Notícias

Uma noiva que fica para tia

Era a partida para uma festa de despedida de solteira, num destino surpresa para a noiva. O tempo de espera pelo check-in deu para perceber a cena, passada no aeroporto Marconi, em Bolonha. Atrás de mim na bicha, uma meia dúzia de adolescentes italianas escoltava uma amiga com um véu branco na cabeça, ouvidos tapados por auscultadores e olhos vendados por um lenço. Só quando o avião da Ryanair já estava no ar é que ela soube que voava para o Porto.

As estatísticas confirmam o que ouvimos e vemos na Baixa, Casa da Música ou marginal. Nunca o Porto teve tantos turistas. Os números aquecem-nos a alma. Apesar da quebra na procura doméstica, no primeiro semestre, as dormidas na Região Norte cresceram 6,6% (acima da média nacional que foi de 5.4%), garantindo à hotelaria uma taxa de ocupação de 40,4%, razoável para uma indústria que sofre a concorrência dos hostels e do alojamento informal.

Os indicadores são animadores, mas não evitam um arrepio na espinha quando reparamos que se o Porto foi eleito o melhor destino europeu e a Ribeira está atulhada de turistas, a TAP está inocente. A culpa é da Ryanair.

Sempre que a privatização da TAP aterra na agenda, tremem logo as beiças dos pânditas que se apressam a vociferar ai-jesus que a companhia aérea de bandeira é estratégica. Acalmem p. f. o histerismo, porque apesar de andar a ser oferecida por todo o Mundo, com um dote não negligenciável, a TAP é uma noiva sem pretendentes idóneos.

Não é só o Norte que tem razões de queixa. A TAP deixou de trabalhar o Algarve, que, abandonado aos charters e às low-cost, sofre cada vez mais com a sazonalidade e perdeu 460 mil dormidas em seis anos. Serviço público? Estratégia? Só para Lisboa, por isso, para a desencalhar e evitar que fique para tia, o melhor é o Costa municipalizá-la. Nós, os da paisagem, precisamos tanto dela como de uma dor de dentes.

As estatísticas do turismo são animadoras, mas não evitam sentirmos uma corrente de ar nas costas quando reparamos que o Governo em vez de ajudar só atrapalha.

Dos estrangeiros que nos visitam, só 60% vêm de avião. E dos que chegam por terra, 30% são espanhóis. Ora a introdução nas ex-scut do mais estúpido sistema de cobrança de portagens jamais inventado criou uma barreira ao fluxo de turistas espanhóis, exterminando as escapadas de curta duração com graves prejuízos para comércio, restauração e hotelaria de Viseu, Guarda, Viana e Algarve. Os números não mentem. No primeiro semestre, Espanha foi a única exceção ao crescimento de visitantes vindos dos maiores mercados emissores.

Portugal e Espanha são os dois únicos países da OCDE onde o turismo pesa dois dígitos no emprego e PIB. O turismo é demasiado importante para continuarmos a sofrer o centralismo da TAP e o amadorismo de governantes. As estatísticas podem ser boas, mas não chegam. A não ser que alguém me explique por que é que Barcelona recebe oito milhões de estrangeiros/ano e Portugal todo não chega aos sete milhões?

Jorge Fiel, no JN

Não temos funcionários públicos a mais

O trabalho dos jornalistas não é repetir como factos as opiniões da moda. É verificar nos factos - na medida em que os factos nos podem dar respostas - a veracidade de ideias feitas. E, se necessário, desmontá-las. Umas das ideias feitas mais indiscutíveis em Portugal é esta: temos funcionários públicos a mais. O peso do Estado é insuportável e é necessário reduzir o número de trabalhadores e os encargos com eles. E como se bem torturados os números confessam sempre o que deles quisermos tirar, as provas desta verdade indesmentível acabam sempre por surgir. E se eles não confessam, inventa-se. Ainda me recordo de se dizer por aí que os salários dos funcionários públicos correspondiam a 80% das despesas do Estado, de tal forma a mentira se tornou banal.

Cumprindo a sua função, a RTP fez as contas às despesas do Estado. Não precisou mais do que ir aos números oficiais. Temos cerca de 575 mil funcionários públicos. Menos do que isto, só em 1991. Chegaram, em 2005, a ser quase 750 mil. Desde então não parou de descer. Sem que, no entanto, tenha havido um despedimento coletivo. Ou seja, ao contrário do reza a lenda, Passos Coelho não chegou ao governo e encontrou um Estado que não parava de engordar. Encontrou muito menos funcionários públicos do que cinco ou seis anos antes. Encontrou um Estado que estava a emagrecer há algum tempo. Pela mão do despesista Sócrates. Que, com exceção daquele aumento em ano de eleições, não se pode dizer que tenha tratado os funcionários públicos bem.

Os funcionários públicos representavam, em 2008 (quando eram mais do que hoje), 12,1% da população ativa. A média dos 32 países da OCDE é de 15%. A Dinamarca e a Noruega aproximam-se dos 30%. Abaixo de nós está, para estragar a dimensão europeia deste mito, a Grécia.

Mesmo assim é insustentável. Porque nós não produzimos a riqueza dos dinamarqueses ou da generalidade dos europeus. Bem, o peso dos vencimentos dos funcionários públicos, em Portugal, em relação à riqueza produzida é inferior à média da UE e da zona euro. 10,5% em Portugal, 10,6% na zona euro, 10,8% na União Europeia, mais de 18% em países como a Dinamarca ou a Noruega. Repito: estamos a falar de percentagens relativas ao PIB. Ou seja, dizer que os outros têm mais capacidade para comportar esta despesa não faz qualquer sentido.

Esta é uma das coisas que mais me perturba nesta crise: a repetição ad nauseam de verdades absolutas que os números e os factos desmentem. Não, o peso do Estado português, ou pelo menos os custos com os seus funcionários, não é incomportável para a riqueza que produzimos. Haverá racionalidade a acrescentar à gestão de pessoal do Estado. Haverá desperdício. Mas nem há funcionários públicos a mais nem eles ganham acima do que a nossa produção de riqueza comporta. Os nossos problemas, no Estado, no privado e na nossa integração europeia, são outros. Os funcionários públicos são apenas o bode expiatório de políticos incapazes de enfrentar os atrasos estruturais do País. E um saco de pancada para quem aposta em virar trabalhadores do privado contra trabalhadores do público para assim não pôr em causa os verdadeiros privilégios instalados.



Daniel Oliveira, no Expresso

Despesa. Autarquias desperdiçam milhões

Fórum das Regiões: E depois veem dizer que há pensionista e funcionários públicos a mais! Se calhar, para estes governantes, também há cidadãos a mais. Será?


Livro analisa a má despesa das câmaras antes das primeiras autárquicas com limitação de mandatos

Milhares de euros em medalhas, em estátuas e monumentos, um deles aos próprios autarcas. Milhares de euros em almoços, concertos, telemóveis, estudos e projectos. Muitos deles ficaram no papel, outros começaram para serem abandonados e alguns revelam-se megalómanos para a dimensão das localidades em que estão inseridos. Os autores do projecto Má Despesa Pública lançaram esta semana o livro que mostra como a má despesa pública é feita nas autarquias. Não pretendem ter todos os casos, mas lançam um alerta aos eleitores em pleno ano de eleições locais - um alerta que Paulo Morais, da Transparência e Integridade, Associação Cívica (TIAC), diz mostrar que "a frase 'andámos a viver acima das nossas possibilidades' só se refere a 15% da dívida privada", porque a maioria da dívida é do Estado e muita dela feita nas autarquias. Nem sempre com grandes projectos, muitas vezes com pequenas despesas que se vão acumulando, como as das refeições.

O ex-ministro Miguel Relvas é um exemplo referido no livro: durante dez anos, por ser presidente da Assembleia Municipal de Tomar, teve a conta de telemóvel paga pela autarquia sem limites, incluindo entre Março de 2002 e Julho de 2004, quando era secretário de Estado da Administração Local. Segundo a revista "Visão", nos últimos seis anos do período em causa, os custos do telemóvel de Miguel Relvas foram de 26 463 euros. O livro de Bárbara Rosa e Rui Oliveira Marques faz uma comparação com o caso do presidente da Assembleia Municipal do Porto, que tem um plafond máximo de 135 euros e prescindiu de o usar.

O livro "Má Despesa Pública nas Autarquias" fala ainda de casos que custaram milhões: em 2012, a câmara de Braga gastou oito milhões de euros no início da construção de uma piscina olímpica, para depois desistir do projecto que, se fosse concluído, custaria um total de 25 milhões. A autarquia justificou-se dizendo que a manutenção energética seria insustentável. E, para dar solução ao esqueleto construído, contratou-se uma empresa que sugeriu a construção de um parque temático. Falta apenas encontrar um investidor privado que o queira concretizar. Ainda em Braga, há o caso do estádio de futebol, construído para o Euro 2004, que custou 121 milhões de euros; a câmara contribuiu com 111 milhões e ainda gasta 400 mil euros anuais em manutenção, ficando o patrocínio do estádio para o clube que o usa.

Além das obras, o livro refere-se, por exemplo, aos gastos em festas e almoços. Um concerto de Tony Carreira em Albufeira, em 2009, custou 75 mil euros, mas em 2012 o cantor actuou por 42 mil euros em Olhão e Cinfães. Em 2011, a câmara do Crato gastou 60 mil euros num concerto dos Gotan Project e 35 mil num de Gabriel o Pensador. Em 2008, Vila Nova da Barquinha começou a preparar um projecto de 170 milhões de euros para construir um parque de diversões para 10 mil pessoas. Nunca saiu do papel. Ourém lançou um projecto de um festival de cinema em Janeiro de 2012. Nunca avançou, mas foram gastos 40 mil euros. Ainda em Ourém, foi criada uma parceria público--privada para a construção de um campo de golfe. Foi assinado um contrato de financiamento de mais de 3 milhões de euros, mas o projecto está suspenso.

Ponte de Sor gastou oito milhões de euros num aeródromo municipal que pode receber aviões como o Airbus A320, com capacidade para 180 passageiros, mas não foi encontrado qualquer estudo para uma infra-estrutura desta dimensão. Portimão quis uma Cidade do Cinema. O investimento anunciado era de 3 mil milhões de euros. O projecto tem apenas uma sala de congressos e gastou 270 mil euros em consultoria e brochuras. Em Junho houve buscas na câmara de Portimão: o vice--presidente, Luís Carito, engoliu um papel quando foi detido.

Em Valongo foram gastos, de forma ilegal, 31 185,69 euros em férias não gozadas dos eleitos locais. O presidente da câmara de Valongo, Fernando Pereira, teve ainda despesas não autorizadas de 11 979,09 em refeições. O vereador José Luís Sousa Pinto teve refeições de 4079,44 euros.
Paulo Morais escreveu o prefácio de um livro que define como "um acto de resistência", porque analisa gastos de "um poder instituído no espaço público com quem ninguém se mete. Tiveram a capacidade de interpretar tudo aquilo que se diz apenas em voz baixa". E, diz, são dados importantes, porque "estas são as primeiras eleições desde que as pessoas sentiram mesmo os efeitos da crise. E as autárquicas de 2013 são as mais importantes de sempre, porque pelo menos 150 presidentes vão mudar. Falta saber se, com a mudança de caras, mudam também as práticas".

Paulo Morais e os autores lembram que em muitos concelhos, principalmente nos mais pequenos, as câmaras municipais são os maiores empregadores. "Há meios em que o melhor é ter uma ligação partidária e assiste-se às transferências entre o partido e a câmara, com custos sobre os nossos impostos, porque se contratam boys pelos votos que conseguiram e independentemente da competência", diz Paulo Morais. O responsável da TIAC destaca ainda a importância dos pelouros de Urbanismo: "No início da crise, 70% da dívida estava alicerçada em dívida imobiliária das câmaras. Há duas actividades de alta rentabilidade: o tráfico de droga e o urbanismo, tendo os promotores imobiliários uma absolvição a partir do momento em que conseguem um alvará de loteamento", referiu ainda, para considerar que este livro "é um instrumento que obriga os candidatos a aumentar a transparência na vida pública portuguesa".


Fonte: Jornal I

A ganância não dorme

As notícias interessam? Um ditador usa armas químicas e o Mundo não se sobressalta. Em resposta os Estados Unidos dispõem-se a lançar bombas em cima dos soldados governamentais sírios como castigo - ainda que a consequência seja facilitar a vida aos rebeldes apoiados pela al-Qaeda. E é entretanto a cada vez menos democrática Rússia que parece trazer uma solução de paz - evitar a viagem dos aviões americanos sem tripulantes (drones) com bombas para o Exército de Assad. A democracia é representada por quem? Que negócios de armamento representam estes bailados diplomáticos?

Com o cenário da guerra o petróleo sobe. O Médio Oriente continua um barril de pólvora mas as nações desenvolvidas não podem suportar energia ainda mais cara. Só que o problema do Médio Oriente já não é dos americanos (eles têm cada vez mais petróleo e gás). Sobra para tomar conta do Médio Oriente a China, que não quer ser polícia do Mundo. Vender armas sim, vender lixo (coisas) sim, mas gastar dinheiro com a ordem mundial, isso não. O mesmo se diga da sistemática cobardia alemã nos conflitos internacionais - sempre poupados, os alemães... Quem diz que a Alemanha é o país mais provinciano entre as grandes potências, tem razão.

Neste mundo paroquial há eleições germânicas a 22 de setembro. Por isso não espanta que a senhora Merkel, dona de casa austera, se prepare para as ganhar de novo, apoiada por um bacoco líder bávaro, de um pequeno partido (tipo CDS), chamado Horst Seehofer. O senhor afirmou num debate televisivo de campanha eleitoral que pediria ao Governo para impor portagens aos veículos estrangeiros que usarem as autoestradas alemãs. No dia em que isso acontecer a xenofobia ao veículo de matrícula estrangeira espalhar-se-á pela Europa toda (calma: a xenofobia é só contra a passagem dos carros). E que tal a xenofobia ao carro alemão?

Sem Alemanha fiável, os países do Sul vivem no limbo à espera da "justiça" dos mercados. E, no entanto, sem se saber muito bem como, estes países do Sul da Europa recuperam. Talvez o turismo anglo-saxónico, escandinavo ou de fora da Europa se tenha virado para o Mediterrâneo onde também "estamos". Egito, Tunísia e Brasil estão num caco e nós ganhamos com isso. O ligeiro alívio na energia dos últimos meses também ajudou às contas públicas. Ou as "férias" dos mercados. Ou os juros "zero" do Banco Central Europeu para ver se a senhora Merkel é eleita... Algo resultou. Será que menos aperto funciona?

Recuperação consistente em Portugal? Não fora o susto do Governo em julho e estaríamos melhor. As pessoas e os consumidores começam a perder o medo. Portas é mais fofo que Gaspar, vamos lá gastar. Também por cá há muitos turistas e as cidades estão cheias, à pinha, neste princípio de setembro. O trânsito no Porto fazia lembrar esta semana a cidade entupida antes de Fernando Gomes - ninguém andava.

Nesta euforia curtinha caem como gelo os cortes aos pensionistas. Os "velhos" (cada vez mais novos) são gaseados com diminuições eternas de rendimentos, um confisco económico e moral face a tudo em que acreditaram ao longo da vida. Não há dinheiro, dizem, embora haja sempre dinheiro para tudo - desde a importante "retoma" da economia à baixa de impostos ou, tão-só, para os gabinetes e outras utilidades duvidosas. A moral do Estado morreu. E com ela a ilegitimidade da fuga ao Fisco ou à Segurança Social. Cortar pensões em 2011 ou 2012 era uma emergência. Isto é a perpetuação do roubo. E como receber uma carta das Finanças todos os meses a exigir 10% do rendimento - ou então a prisão. É um assalto para sempre.

E por isso a Síria ou a indiferença aos gaseados, a Alemanha ou a indiferença aos pobres do Sul, o Governo ou a rendição à inevitabilidade nos cortes aos reformados são a mesma coisa: danos colaterais de grandes estratégias assentes na Economia - a maximização do resultado independentemente da consequência. Por outras palavras, a doutrina da ganância. Resulta sempre porque os outros são "sírios". É-nos indiferente. E nesta letargia vai-se perdendo tudo.


Daniel Deusdado, no JN