As notícias interessam? Um ditador usa armas
químicas e o Mundo não se sobressalta. Em resposta os Estados Unidos dispõem-se
a lançar bombas em cima dos soldados governamentais sírios como castigo - ainda
que a consequência seja facilitar a vida aos rebeldes apoiados pela al-Qaeda. E
é entretanto a cada vez menos democrática Rússia que parece trazer uma solução
de paz - evitar a viagem dos aviões americanos sem tripulantes (drones) com
bombas para o Exército de Assad. A democracia é representada por quem? Que
negócios de armamento representam estes bailados diplomáticos?
Com o cenário da guerra o petróleo sobe. O
Médio Oriente continua um barril de pólvora mas as nações desenvolvidas não
podem suportar energia ainda mais cara. Só que o problema do Médio Oriente já
não é dos americanos (eles têm cada vez mais petróleo e gás). Sobra para tomar
conta do Médio Oriente a China, que não quer ser polícia do Mundo. Vender armas
sim, vender lixo (coisas) sim, mas gastar dinheiro com a ordem mundial, isso
não. O mesmo se diga da sistemática cobardia alemã nos conflitos internacionais
- sempre poupados, os alemães... Quem diz que a Alemanha é o país mais
provinciano entre as grandes potências, tem razão.
Neste mundo paroquial há eleições germânicas a
22 de setembro. Por isso não espanta que a senhora Merkel, dona de casa
austera, se prepare para as ganhar de novo, apoiada por um bacoco líder bávaro,
de um pequeno partido (tipo CDS), chamado Horst Seehofer. O senhor afirmou num
debate televisivo de campanha eleitoral que pediria ao Governo para impor
portagens aos veículos estrangeiros que usarem as autoestradas alemãs. No dia
em que isso acontecer a xenofobia ao veículo de matrícula estrangeira
espalhar-se-á pela Europa toda (calma: a xenofobia é só contra a passagem dos
carros). E que tal a xenofobia ao carro alemão?
Sem Alemanha fiável, os países do Sul vivem no
limbo à espera da "justiça" dos mercados. E, no entanto, sem se saber
muito bem como, estes países do Sul da Europa recuperam. Talvez o turismo
anglo-saxónico, escandinavo ou de fora da Europa se tenha virado para o
Mediterrâneo onde também "estamos". Egito, Tunísia e Brasil estão num
caco e nós ganhamos com isso. O ligeiro alívio na energia dos últimos meses
também ajudou às contas públicas. Ou as "férias" dos mercados. Ou os
juros "zero" do Banco Central Europeu para ver se a senhora Merkel é
eleita... Algo resultou. Será que menos aperto funciona?
Recuperação consistente em Portugal? Não fora
o susto do Governo em julho e estaríamos melhor. As pessoas e os consumidores
começam a perder o medo. Portas é mais fofo que Gaspar, vamos lá gastar. Também
por cá há muitos turistas e as cidades estão cheias, à pinha, neste princípio
de setembro. O trânsito no Porto fazia lembrar esta semana a cidade entupida
antes de Fernando Gomes - ninguém andava.
Nesta euforia curtinha caem como gelo os
cortes aos pensionistas. Os "velhos" (cada vez mais novos) são
gaseados com diminuições eternas de rendimentos, um confisco económico e moral
face a tudo em que acreditaram ao longo da vida. Não há dinheiro, dizem, embora
haja sempre dinheiro para tudo - desde a importante "retoma" da
economia à baixa de impostos ou, tão-só, para os gabinetes e outras utilidades
duvidosas. A moral do Estado morreu. E com ela a ilegitimidade da fuga ao Fisco
ou à Segurança Social. Cortar pensões em 2011 ou 2012 era uma emergência. Isto
é a perpetuação do roubo. E como receber uma carta das Finanças todos os meses
a exigir 10% do rendimento - ou então a prisão. É um assalto para sempre.
E por isso a Síria ou a indiferença aos
gaseados, a Alemanha ou a indiferença aos pobres do Sul, o Governo ou a
rendição à inevitabilidade nos cortes aos reformados são a mesma coisa: danos
colaterais de grandes estratégias assentes na Economia - a maximização do
resultado independentemente da consequência. Por outras palavras, a doutrina da
ganância. Resulta sempre porque os outros são "sírios". É-nos
indiferente. E nesta letargia vai-se perdendo tudo.
Daniel Deusdado, no JN
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