O sol, o vinho do Porto, as sardinhas assadas
ou o fado deviam ser por si só razões bastantes para potenciar no estrangeiro a
indústria do turismo portuguesa. São poucas alíneas de atratividade? Junte-se-lhes
a riqueza histórica e paisagística, a monumentalidade ou a excelência de certos
serviços e um custo de vida relativamente barato, quando comparado com outros
destinos. Vender um potencial assim não está ao alcance de todas as nações, mas
por cá existe sempre quem tente inovar pela via menos adequada: pôr o país de
cócoras.
Descontados os muitos vídeos promocionais
conhecidos por serem marcados por cenas de puro servilismo nacional, chegou uma
nova moda: atrair os cidadãos estrangeiros em idade de reforma para gozarem o
fim de linha das suas vidas em território português.
Lançado em janeiro, o programa visa o chamado
dois em um.
Por um lado, o convencimento de fixação de
residência em Portugal de ingleses, franceses, russos ou chineses fará mexer a
economia, esteja ela ligada à compra de salsichas ou de remédios para o
reumatismo; por outro lado, quem para o Algarve ou o Alto Douro venha viver
precisa de dispor de uma habitação e o país está encharcado de imóveis às
moscas - no essencial da responsabilidade dos bancos responsáveis pela promoção
e concessão de crédito fácil a qualquer bicho- -careta ou pato-bravo da
construção civil quando ainda se pensava que o Terreiro do Paço dispunha de uma
fábrica de fazer notas de euro.
A tese da captação de investimento pela
fixação de cidadãos estrangeiros em Portugal não contém em si nenhum pecado
mortal. Num mundo cada vez mais concorrencial dá-se é o caso de, a páginas
tantas, tornar--se desvantajosa a condição de ser português em Portugal.
Mais interessado nos vícios e nas guerras de
alecrim e manjerona dos protagonistas do Poder, o país prestou pouca atenção,
por exemplo, à grande movida de gauleses ao Salão Imobiliário português
realizado no último fim de semana em Paris. O objetivo da mostra era, naturalmente,
o de divulgar as vantagens da compra de uma casinha em Portugal, obtendo
benefícios se cumprido o compromisso de passar a residir fiscalmente por cá e
comprovar a presença no país pelo prazo mínimo de 183 dias por ano. Um belo
isco!, fundamentado na legislação existente a partir de 1 de janeiro e segundo
a qual os residentes em Portugal que recebam reformas de fontes estrangeiras
estão isentos de impostos sobre as suas pensões privadas.
As vantagens do programa para um estrangeiro
ficaram bem caracterizadas no jornal "Le Figaro", classificando a
costa portuguesa como o novo eldorado e apelidando Portugal como "o novo
paraíso fiscal para os reformados franceses".
Sim, a tese poderia ser só elogiosa, mas não.
Quando em Portugal a esmagadora maioria dos pensionistas e reformados recebem
menos de 600 euros por mês e os que auferem acima de tal patamar de quase
miséria estão sob o cutelo de mais e mais impostos e contribuições
extraordinárias, não é nada de louvar os traços gerais do chamariz à terceira idade
de outros países para as fronteiras nacionais.
É aconselhável não ultrapassar mínimos de
dignidade. Portugal precisa de investimento e de novas fontes geradoras de
riqueza. Deve, no entanto, dispensar a aviltação de tornar mais pobres os seus
reformados e pensionistas pretendendo colocá-los como servos de velhinhos
endinheirados a quem o país concede benesses.
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