O "Fórum das Regiões", defende uma Região Norte coincidente com a actual região-plano (CCDR-N) e um modelo de regionalização administrativa, tal como o consagrado na Constituição da República Portuguesa.

O "Fórum das Regiões", considera a Regionalização o melhor modelo para o desenvolvimento de Portugal e para ultrapassar o crescente empobrecimento com que a Região Norte se depara.


quinta-feira, 5 de julho de 2012

Não dêem ideias ao Povo!

“Há quem se ponha a reler as aventuras das defuntas FP-25 e a vivíssima parábola do burro do cigano”

Bigodes enrolados, cabelos grisalhos pendentes costas abaixo, estaciona a carripana às três pancadas, uma roda a pisar a passadeira dos peões. Empurra a barriga e sai a custo do carrito amolgado, para dar de caras com o polícia de giro. "Olhe que não pode estacionar assim!" O cívico apanha logo com a tirada tonitruante do homem: "Toma é conta do carro, que é para isso que te pagam!" Começa a discussão. O polícia, paciente, aconselha modos ao castiço. "Olhe que ainda vai detido!"

O sexagenário assume a veterania militar. "Já matei por muito menos, em nome da Pátria! Por isso, tem lá cuidado, ó jovem!" Assim sendo, toca de passar a multa. Mãos na anca, o homem encolhe os ombros. "Multa à vontade! Não pago multas!" O polícia admira-se. "Não paga?! Então porquê?" Ar malandro e semblante compungido, o homem explica-se. "Até pagava, mas... a minha religião não me permite pagar multas! Está na Lei 16/2001 de 22 de Junho!" Dá meia volta e põe-se ao fresco, passo firme e sorriso agaiatado. Esferográfica suspensa, ao polícia dá-lhe para coçar o nariz, em jeito de "será que isto está mesmo na lei?"

Testemunha da cena, deu-me para pensar que, em nome de interpretação muito própria da Bíblia, muitos Testemunhas de Jeová acabaram a ferros por se recusarem a verter sangue na tropa, ao tempo da Guerra de África. Protegiam-se das labaredas do Inferno ao preservarem o próprio sangue de uma indesejável transfusão. Hoje, a objecção de consciência está consignada na lei.

O meu amigo Zé dos Pneus pôs-se a pensar: "Imagina só 10 milhões de portugas objectores de consciência a cumprir os mandamentos da religião do camarada das multas?!" Imaginei Vítor Gaspar a justificar-se à troika: "O governo até quer cumprir os compromissos a tempo e horas, mas nem consciência, nem religião permitem ao nosso Povo pagar juros tão altos, muito menos a agiotagem..."

Prova a História que de barrigas vazias brotam radicalismos políticos e religiosos. Mas os portugueses são originais. Por força de desvairadas desventuras, desenvolveram intrincado espírito de resistência e resguardam-se sob uma capa diáfana de serenidade e paciência. Obrigados a alinhar em grandes jejuns, habituaram o estômago e aguçaram o engenho. Mas vão desabrochando novas e antigas crenças. Indecisos entre o desemprego e a emigração, há quem se ponha a reler as aventuras das defuntas FP-25 e a vivíssima parábola do burro do cigano. Zé dos Pneus, guerra feita no Ultramar, leva as mãos à cabeça: "Senhores governantes, não dêem ideias ao Povo!"

Por:Victor Bandarra, Jornalista (vmbandarra@tvi.pt)

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