A entrada de Pires de Lima para o Ministério
da Economia foi recebida pelos empresários de todo o país como uma boa notícia.
Não apenas porque se livravam de Álvaro Santos Pereira, a quem nunca deram o
benefício da dúvida, mas sobretudo porque viam no ex-presidente da UNICER
alguém que conhece bem o tecido empresarial e que, por isso mesmo, há muito
vinha defendendo, sem papas na língua, o que as pequenas, as médias e até as
grandes empresas reclamavam. Nesse sentido, e também porque faz parte do grupo
mais próximo do vice-primeiro-ministro, Pires de Lima deveria ser o braço
armado, digamos assim, das empresas no Governo.
O que pode dizer-se passado tão pouco tempo
sobre a tomada de posse de Pires de Lima? Talvez tenhamos trocado um excelente
empresário por um sofrível ministro. A coisa seria aceitável, não se desse o
caso de o país precisar, hoje mais do que nunca, de um excelente ministro da
Economia. O homem que batia ferozmente na política de Vítor Gaspar amansou
rapidamente. É certo que, enquanto membro do Executivo, tem um dever de
lealdade que lhe trava a verve. Mas, se atentarmos no Orçamento do Estado (OE)
para 2014 que nos foi apresentado, o mínimo que pode dizer-se é que Pires de
Lima averbou uma pesada derrota.
Era ele que dizia em voz alta o que Paulo
Portas pensava em tom baixo e estava proibido de afirmar em público. Era ele
que firmava e reafirmava, em frente às câmaras de televisão, os valores do
CDS-PP, aqueles que constituem (ou supostamente devem constituir) a famosa
"linha vermelha" que o líder do partido não admite pisar. Numa
palavra, era ele, pela liberdade oratória que possuía, que apontava a Passos
Coelho o caminho que o CDS-PP gostava de ver trilhado, sempre em defesa dos mais
pobres, dos que mais sofrem, dos que são assaltados pelo Estado com uma
despudorada intensidade e regularidade.
Era ele que pugnava pela descida do IRS. Era
ele que se batia pela redução do IVA da restauração. Era ele que defendia o
aumento, o mais depressa possível, do salário mínimo nacional. Era ele que
queria ver no terreno a reforma do IRC. E por aí fora, num tom sempre de
sentido contrário ao que estava a ser usado pelo Governo. Excluindo o IRC, mais
nada do que Pires de Lima almejava ganhou corpo. Se fosse ainda empresário,
Pires de Lima podia dizer deste OE o que Maomé não disse do toucinho. Assim, o
máximo que consegue dizer é que este OE já devia ter sido feito em 2012. Ai
sim?
Confrontado, há dias, com a evidência dos
factos, o ministro respondeu, algo irritado, que nada disto belisca a confiança
que o primeiro-ministro nele mantém. Pois não. Para o primeiro-ministro, a
entrada de Pires de Lima no Governo deu, de resto, muito jeito: retirou da
praça pública um dos mais procurados comentadores das medidas draconianas do
Governo. Calou-o.
"Sei que a minha entrada no Governo
correspondeu a um excesso de expetativas. E também tinha a noção que muito
provavelmente o meu estado de graça ia terminar quando se apresentasse o
Orçamento do Estado para 2014", disse Pires de Lima em entrevista ao
"Expresso". É uma análise lúcida. "Grandes amores e enganos
comportam grandes riscos", disse Dalai Lama. Quem terá enganado Pires de
Lima?
Paulo Ferreira, no JN
Sem comentários:
Enviar um comentário