1. Em pleno agosto o secretário de Estado dos
Transportes, Sérgio Monteiro, consegue oficializar em "Diário da
República" a criação de um "Grupo de Trabalho para as Infraestruturas
de Valor Acrescentado" (GTIVA) com o objetivo de estudar os novos projetos
na área da mobilidade do país - investimentos no porto de Sines e outros ao
longo do país, a nova ferrovia de bitola europeia, políticas aeroportuárias,
rodovias, etc..
2. Sérgio Monteiro escolhe para presidir ao
grupo José Eduardo Carvalho, um empresário e ex-mandatário de Miguel Relvas
pelo PSD de Santarém em 2009 que é, simultaneamente, o presidente da Associação
Industrial Portuguesa (com sede em Lisboa). Não é convidada a Associação
Empresarial de Portugal (AEP), nem a Associação Industrial do Minho, nem o
Conselho Empresarial do Centro (CEC). Só há um lugar para os empresários - a
Confederação da Indústria Portuguesa. O GTIVA inclui o próprio Estado (LNEC,
AICEP, Instituto Mobilidade Terrestre, CP, REFER) e as associações setoriais:
Logística, Carregadores, Transportes Rodoviários, Mercadorias, além do operador
privado de ferrovia, Takargo. Está também a Associação de Municípios, mas não
estão as comissões de Coordenação Regionais (sobretudo Norte e Centro, com
trabalho feito nestes dossiers). Questão: o GTIVA (as tais 16 entidades) têm
alguma capacidade de dizer "não" aos investimentos mais vultuosos que
o Governo queira apresentar-lhes como cenoura apetitosa à frente do nariz? Não
é crível. Os milhões são bons para todos os que lá estão sentados.
Investimentos novos!, sejam eles quais forem.
3. Várias fontes afirmam que o principal
objetivo do Governo é o de fazer um novo porto na outra margem de Lisboa
(Trafaria) a todo o custo. O tal porto, supostamente privado, que precisa de
quase mil milhões de investimento em infraestruturas ferroviárias, pagas por
dinheiro comunitário e público. Algo para mostrar e criar emprego rapidamente.
4. O que fizeram as Comissões de Coordenação e
Desenvolvimento do Norte e Centro, juntamente com a AEP, AI Minho e CEC?
Criaram um grupo de trabalho para mostrar que os empresários (os tais,
exportadores, de que o Governo não para de elogiar) têm de ter uma palavra a
dizer sobre como precisam de exportar. Esse trabalho ficou pronto há mais de
uma semana e uma conferência de Imprensa esteve marcada para terça-feira.
Há outra versão, mais consistente: o
secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, o nortenho Castro Almeida,
pede em desespero de causa ao presidente da CCDRN, Emídio Gomes, que cancele a
conferência de Imprensa porque o Governo não quer ter os
"exportadores" contra uma estratégia do Governo que já está a avançar
a grande velocidade. Em consequência desta pressão, a CCDRN comunica
unilateralmente aos outros parceiros a impossibilidade de se fazer a
conferência de Imprensa. Tudo isto num contexto em que Castro Almeida
e as Comissões de Coordenação estão impotentes para conseguir que os fundos
comunitários 2014-2020 sejam atribuídos - mas também selecionados e geridos
tecnicamente - nas regiões fora de Lisboa. Uma guerra quase perdida, diz-se.
A máquina do Estado está ao rubro. Quem fica
com os fundos? E quem assegura os milhões com que se remunera os batalhões
administrativos de aprovação de candidaturas europeias, advogados, consultores
próximos do poder, etc., no formato "business as usual"? Lisboa não
quer abrir mão desses empregos altamente remunerados.
Ninguém sabe como isto vai acabar - de que
lado está Poiares Maduro ou Pires de Lima, Passos ou Portas. Quem é a voz do
resto do país nisto. Enquanto isso, os números revelados há dias pelo JN
mostram a acentuação das assimetrias Lisboa/resto do país na distribuição per
capita do rendimento.
Enquanto isso, e debaixo do manto hipnótico
das discussões troikianas, ficam duas perguntas concretas: a Trafaria é a nova
Ota? E o farisaísmo centralista permanece para sempre?
Daniel Deusdado, no JN
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