Já passou um terço do mês de agosto e,
estranhamente, há poucos sinais da cíclica "silly season". É certo
que o fim do verão ainda está longe e que já este fim de semana a imprensa nos
brindou com uma longa matéria sobre a palpitante e extraordinária existência de
500 anões a viver em Portugal, mas a explicação para não termos dado pela
"patética estação" pode ter a ver com habituação. De tanto disparate
nos entrar pela vida adentro, este ano não há "silly season" capaz de
nos surpreender. Vem isto a propósito de uma notícia publicada ontem à tarde na
edição digital do Jornal de Notícias. Desta vez, a aparente tolice (e era mesmo
só aparente) vinha da Noruega, onde o primeiro-ministro decidiu revelar que,
recentemente, se tinha disfarçado de taxista de Oslo, para aferir das
preocupações dos seus conterrâneos. Sem intermediários. Contava a notícia do
JN.PT que Jens Stoltenberg vestiu um uniforme de taxista e colocou óculos de
sol, ainda que o disfarce não tenha enganado todos. As conversas do inusitado
motorista com os seus passageiros foram gravadas por uma câmara oculta, para
uso posterior num vídeo da campanha para a reeleição de Stoltenberg. A
explicação para a aventura do primeiro-ministro é simples: "Se há um sítio
onde as pessoas dizem realmente o que pensam sobre quase tudo, é no táxi".
A 3600 quilómetros
de Oslo, há outro líder de Governo que nem disfarçado conseguiria evitar ouvir
as queixas dos seus compatriotas. Chama-se Pedro Passos Coelho e usa óculos de
sol, mas para encarar a claridade do dia no Algarve, onde se encontra a gozar
férias. Merecidas, claro, após um ano de cortes intensos e trabalhosas
remodelações sem fim à vista. Ontem, a segurança do veraneante ilustre afastou
uns prudentes 100 metros
da casa na Manta Rota, onde Passos descansa, os elementos da Comissão de
Utentes da Via do Infante que, uma vez mais, saíram à rua para contestar as
portagens naquela importante estrada. O protesto será certamente inglório. Um
dos membros da dita comissão queixava-se de já no ano passado ter tentado, sem
sucesso, entregar a Passos Coelho uma carta. Este ano, insistiu na façanha, mas
vai certamente ficar a falar sozinho. Se fosse na Noruega, pouparia o megafone,
as panelas e os cartazes. Bastaria apanhar um táxi. E, para que não restassem
dúvidas, seria o próprio governante, como fez Stoltenberg, a colocar no
Facebook, Twitter e YouTube o resultado do contacto com o povo.
Cá, onde a classe política faz de conta que
usa as modernas ferramentas para comunicar com as pessoas, seria certamente
diferente. Passos Coelho, que também está no Facebook, resolveu baldar-se para
os eleitores que lhe deram os votos e os "likes" e, mal começou a ser
contestado no mundo digital - como se fosse diferente das ruas -, decidiu
deixar de atualizar a página. Parou a 26 de Dezembro do ano passado, após uma
patética mensagem de Natal que mereceu qualquer coisa como 28 mil comentários,
para não dizer insultos. Imagine-se o que seria desde então com tanta
trapalhada governativa...
É também nas redes que Jens Stoltenberg revela
que em Oslo nenhum dos passageiros do camuflado chefe de Governo pagou a
corrida. Por cá, não temos a mesma sorte e a coisa vai piorar. É só esperar
pelo Orçamento do Estado para ver quantas corridas vamos ter que pagar a Passos
Coelho.
Alfredo Leite, no JN
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